02 janeiro 2007

Sob o fantasma de Saddam Hussein

O ano jurídico de 2007 começou mal - muito mal.
Nenhuma cidadão honrado ficou indiferente a essa vergonha que foi o assassinato de Saddam Hussein.
A crise da Justiça - a falência da Justiça - deixou de ser uma questão localizada, para assumir contornos globais que a descredibilizarão no plano universal.
É preciso ter a noção da História, para que possamos aperceber-nos de que trinta anos são um tempo muito diminuto.
E é preciso ter a noção do tempo, para podermos concluir que a memória não se limpa com a mesma facilidade com que se formata um disco rígido.
Os poderes e os interesses do momento estão a reescrever a biografia de Saddam Hussein. Mas esqueceram-se de limpar os arquivos e isso dá à História dos últimos dias um aspecto grotesco.
Veja-se o que se contém em The National Security Archives...
Nunca tive uma qualquer admiração por Saddam Hussein, que conheci como um aliado do governo de Ronald Reagan, era eu jornalista do «Portugal Hoje», aos tempos da guerra Irão-Iraque.
Ditador? Sem dúvida, como tantos outros, a quem o Ocidente não fazia um reparo ou uma critica. Ditador muito mais «suave» que qualquer dos oligarcas do Golfo...
Pela mesma razão porque se tolera o assassinato de Saddam Hussein, teriamos que tolerar o assassinato de todos os os demais ditadores da região ou mesmo o assassinato do Presidente da América, que mandou matar, sem nenhuma razão ou fundamento muito mais civis inocentes do que os que justificaram o enforcamento, ao vivo e a cores, do antigo Presidente do Iraque.
Dramático é que se aproveite a Justiça para dramatizar uma comédia política, pisando grosseiramente as regras mais elementares do direito moderno.
O assassinato de Saddam Hussein foi isso mesmo: a chacota da Justiça, só compreensível porque, também no plano internacional, a dita está falida e pode ser usada para tudo. Até para calar alguém que podia ser incómodo para a História.
Maus presságios para 2007...