05 agosto 2006

4 de Agosto de 2006

A Ordem dos Advogados passou a comentar as decisões judiciais, o que constitui uma experiência inédita, pelo que pode ter de fracturante.

Leio num telegrama da Lusa, que, aliás, a Ordem se incumbiu de colocar no seu site:
«Caso Gisberta: Ordem dos Advogados concorda com medidas tutelares aplicadas > Lusa
03-08-2006


A Ordem dos Advogados concordou hoje com as penas aplicadas aos menores envolvidos nos maus-tratos ao transsexual Gisberta, em Fevereiro, ressalvando, no entanto, que a amplitude das medidas tutelares poderia ir até aos 24 meses.


Em declarações à agência Lusa, Luís Filipe Carvalho, do Conselho Geral da Ordem dos Advogados, salientou que não foram aplicadas penas, mas "medidas tutelares", que de acordo com a Lei se poderiam situar "entre os três e os 24 meses".
"As medidas tutelares aplicadas, que têm uma forte carga de reinserção social e não tanto de punição, correspondem a metade daquilo que seria a amplitude da medida tutelar que poderia ser aplicada", disse Luís Filipe Carvalho.
O Tribunal de Família e Menores do Porto (TFMP) condenou terça- feira os 13 menores envolvidos nos maus tratos ao transsexual a penas entre os 11 e os 13 meses de internamento em centros educativos, dividindo a condenação em três grupos de menores, com penas diferenciadas.
Um primeiro grupo, de seis, foi condenado pela prática de crimes de ofensas à integridade física qualificada na forma consumada e crimes de profanação de cadáver na forma tentada, tendo-lhes sido aplicada a medida tutelar de internamento em centro educativo em regime semi-aberto, pelo período de 13 meses.
O segundo grupo, de cinco menores, foi condenado pelo crime de ofensa de integridade física na forma consumada, com medida tutelar de internamento em centro educativo pelo prazo de 11 meses.
O terceiro grupo, constituído por dois menores, foi condenado pelo tribunal pelo crime de omissão de auxílio, com medida tutelar de acompanhamento educativo pelo prazo de 12 meses.
O transsexual brasileiro Gisberto Salce Júnior, 46 anos - conhecido por Gisberta - morreu em Fevereiro deste ano na sequência de várias agressões e o seu corpo foi encontrado submerso no fosso de um prédio inacabado, no Campo 24 de Agosto, Porto, depois de um dos jovens ter contado o sucedido a um professor.
Um perito médico-legal concluiu que o transsexual morreu vítima de afogamento e que as lesões que lhe foram alegadamente infligidas pelos menores não eram fatais.
"É necessário perceber que a Lei aplicável a estas condutas puníveis criminalmente é diferente se o menor tiver entre os 12 e os 16 anos.
Neste caso, a sanção é cumprida num estabelecimento educacional com o intuito de reinserção e reformação de personalidade", explicou.
"O grau de censura social é o mesmo, mas é diferente do grau de censura legal. O legislador considera que entre os 12 e os 16 anos o menor ainda está numa fase de formação da sua personalidade", acrescentou. Tendo em conta esse princípio, a Ordem dos Advogados "concorda com as medidas tutelares".
Segundo Luís Filipe Carvalho, a Lei pretende que o menor proceda à interiorização de valores e à aquisição de recursos que lhe permitirão, no futuro, conduzir a sua vida de modo social e juridicamente responsável.
"Se percebermos os objectivos do legislador não há impunidade. No entanto, se estes casos se generalizarem é necessário ponderar uma eventual alteração da Lei", concluiu.
No regime semi-aberto, aplicado aos menores, os educandos frequentam actividades educativas e de tempos livres no estabelecimento, e só poderão ser autorizados a sair para frequência de actividades no exterior desde que acompanhados por pessoal de intervenção educativa.
Por outro lado, estas saídas estão condicionadas à avaliação contínua e rigorosa do grau de adesão do educando ao seu projecto educativo pessoal e ao cumprimento das normas e orientações que lhe são fixadas.
Agência Lusa, em 3 de Agosto de 2006, por MLS»
Uma coisa é a opinião dos advogados sobre um concreto caso jurídico.
Outra, bem diversa, é o envolvimento da Ordem em defesa de uma determinada posição.
Significa isto, pura e simplesmente, que corremos o risco de haver advogados que advogam no sentido do pensamento da Ordem e outros que advogam contra o pensamento da Ordem.
Onde é que isto já se viu?

Sem comentários: