25 julho 2006

25 de Julho de 2006


Consegui arranjar tempo para ler, cuidadosa e pausadamente, a defesa apresentada por José Miguel Júdice no julgamento a que foi sujeito.
É uma peça notável, que ficará nos anais da advocacia portuguesa.
A primeira conclusão que tiro é a de que o Bastonário em exercício e os membros do Conselho Superior não têm, depois do que disse JMJ, as mínimas condições para concluir o seu mandato.
Será bom que tenham a coragem de renunciar, para bem da Ordem e do progresso do Direito.
Lida a defesa de JMJ fica mais claro o patético da nota emitida por Rogério Alves no dia 24 de Julho e que reza assim:

«Na passada sexta-feira, dia 21, teve lugar a audiência pública de julgamento do Sr. Bastonário José Miguel Júdice.
A forma como a audiência se desenrolou deu origem a um vasto conjunto de notícias, comentários e tomadas de posição, contendo, nalguns casos, críticas ao comportamento dos órgãos da Ordem dos Advogados, e, nomeadamente ao do Conselho Superior, que tem competência para proceder ao julgamento.
Compete-me, como Bastonário, tomar posição sobre este acervo de acontecimentos, o que, naturalmente, farei.
Entendo, todavia, que não me deverei pronunciar sobre um caso em concreto, sem que antes seja conhecida a decisão. Quando a decisão for proferida, direi então o que considere pertinente, no cumprimento das minhas funções de Bastonário. »
Não estão em causa as notícias... Está em causa o disse, preto no branco, o antigo Bastonário, em audiência pública e que se contém numa peça escrita.
O facto de o Conselho Superior não ter querido ouvir o que disse Júdice não retira nenhum efeito às palavras.
Ou JMJ mente - e deve ser sujeito a novo processo disciplinar - ou diz a verdade.
Conheço-o há mais de 30 anos e estou convencido de que é verdade tudo o que ele disse e escreveu com o brilho que lhe conhecemos.
Tenho que dar o benefício da dúvida a Rogério Alves e colocar aqui, formalmente, um desafiante «se» para dizer que se for verdade o que diz JMJ, o Bastonário em exercício não tem condições para continuar mais um minuto à frente da Ordem dos Advogados.
Os cidadãos não compreendem nem toleram que a Ordem dos Advogados possa ser dirigida por um bando de canalhas. Quem ler a defesa de JMJ conclui que é isso que está a acontecer.
Com a elegância que lhe conhecemos mas também com a frontalidade que sempre marcou as suas intervenções públicas, JMJ aponta ao Bastonário em exercício um conjunto de atitudes que se elevam à categoria da canalhice pura e que, se corresponderem à verdade, impedem Rogério Alves de manter o Bastonato.
Eu não tolero que a minha Ordem tenha como Bastonário um indivíduo que tenha práticas do tipo das imputadas por JMJ a Rogério Alves.
Damos todos a Rogério Alves o benefício da dúvida e exigimos lhe seja assegurado, em toda a plenitude, o direito de defesa, mas não podemos aceitar que, depois do que foi dito a seu respeito, se remeta ao silêncio.
A gravidade do que foi dito por JMJ - e que constitui uma autêntica acusação, para além do mais pública contra o Bastonário em exercício - justificava que, de imediato se abrisse processo para averiguar da veracidade das imputações.
Mas justificava, sobretudo, que Rogério Alves viesse, de imediato dar esclarecimentos, o que ele não faz e, naturalmente, faria se fosse mentira o que diz Júdice.
Não é uma pessoa qualquer a imputar a Rógério Alves comportamentos gravíssimos: é o anterior Bastonário. E isso não pode deixar de ter um peso na opinião pública e em todos nós, com consequências imediatas.
O que está a ocorrer na advocacia portuguesa tem que se analisar em dois planos relevantes:
a) O jurídico-disciplinar;
b) O político
O jurídico-disciplinar é meramente formal e instrumental do político.
O que está em causa nestes processos é tudo menos disciplinar. São, clara e objectivamente, jogos de poder.
Não fosse isso e JMJ não estaria a ser julgado por um delito de opinião e por um tribunal-faz-tudo, sendo simultaneamente acusador e julgador.
Os membros do Conselho Superior não podem invocar que não se aperceberam disto, que é absolutamente chocante no nosso quadro constitucional.
E nós, cidadãos e advogados, temos que nos questionar como é que é possivel que o mais alto órgão jurisdiconal da nossa Ordem possa seguir um tal caminho.
Podemos nós admitir que, amanhã, um juiz possa acusar e julgar no mesmo processo?
Podemos admitir que, na falta do juiz, o possa fazer o Ministério Público?
O que aconteceu neste julgamento, cujo desfecho ainda não se conhece, é, talvez, a página mais negra da advocacia portuguesa.
Em minha opinião nem o Bastonário nem o Conselho Superior tem as mínimas condições para cumprir as suas funções, porque estão completamente desacreditados perante a opinião pública.
Era bom que tivessem consciência da gravidade da situação e renunciassem, abrindo porta a um processo de eleições antecipadas.

Sem comentários: