01 setembro 2014

A justiça em contentores

Uma excelente imagem da justiça portuguesa, nas palavras do Dr. António Jaime Martins, Presidente do Conselho Distrital de LIsboa da Ordem dos Advogados:

"Como sabemos, tem hoje início um novo ano judicial. Nada de extraordinário nisso haveria, não fosse a coincidência da entrada em vigor da nova organização judiciária.

Pois bem, estive na hora da abertura ao público de uma das novas três comarcas de Lisboa, a Comarca de Lisboa Norte, a qual tem, como muitos de vós já saberão, a sede em Loures parcialmente instalada em “contentores”. Com efeito, a grande instância cível da Comarca de Lisboa Norte que resolverá todas as causas cíveis de valor superior a cinquenta mil euros e que tramitavam em Loures, Vila Franca de Xira, Torres Vedras, Alenquer, Cadaval e Lourinhã, está instalada nestes “contentores climatizados” e, bem assim, toda a instância local cível e a 1.ª secção do Tribunal do Trabalho da nova comarca, com os processos de Loures e Odivelas, também ali instalada. São mais de cento e oitenta mil processos a tramitar nestas condições.


Ora, o direito de acesso dos cidadãos à Justiça e aos Tribunais que constitui um seu direito fundamental, como resulta do art.º 20.º, n.º 1 da nossa Lei Fundamental, não é compatível, salvo melhor opinião, com a realização de Justiça em “contentores”.


Encerrarem-se Tribunais, retirarem-se competências a muitos dos que permanecem abertos e deixarem-se edifícios públicos ao abandono, para se recorrer à instalação de serviços de Justiça em “contentores”, não parece justificável ao abrigo de qualquer exigência de redução de gasto, até porque a mesma está por demonstrar. Trata-se de uma opção errada que urge reparar de imediato!


A situação é tanto mais preocupante quanto, no momento em que redijo esta mensagem, a plataforma informática CITIUS, contínua indisponível para a prática de quaisquer actos.


Entretanto, e como sabemos, os nossos “prazos” correm implacavelmente com ou sem CITIUS a funcionar. Ora, a verificar-se a subsistência desta indisponibilidade, e enquanto a mesma se verificar, deverão as peças e os requerimentos a apresentar em juízo através da referida plataforma, ser remetidos aos Tribunais nos termos dos n.ºs 7 e 8 do art.º 144.º do Código de Processo Civil, ou seja, recorrendo aos meios “tradicionais”, por entrega directa na secretaria judicial, por telecópia ou por registo do correio. No que tange à expedição por correio, com a cautela de a remessa não ser feita para Tribunal extinto como é o caso no distrito judicial de Lisboa das comarcas do Bombarral e do Cadaval.


Apesar do início (no mínimo) pouco prometedor, não posso nem quero deixar de Vos desejar a todos um bom ano judicial, com o compromisso do Conselho a que presido procurar, activamente, melhorar o exercício desta tão nobre profissão que é a de Advogado(a)."

 

Sem comentários: