24 julho 2006

24 de Julho de 2006

Tive dificuldade em adormecer depois de ter lido o que encontrei na net sobre o julgamento do José Miguel Júdice.
Acabei por não resistir à insónia e por voltar ao computador, para lhe dirigir uma mensagem.
Eu, que o conheço, imagino a humilhação a que terá sido sujeito.
Não se deixa uma pessoa - ainda por cima um Bastonário, que o foi e nos termos do Estatuto continua a sê-lo - a falar sozinho.

Meu Querido Amigo:

Estou no Brasil e tomei hoje conhecimento do que aconteceu na passada sexta-feira.
Estou indignado.
Ou esta gente é imediatamente posta em causa ou estaremos a assistir passivamente ao fim da advocacia.
Li numa notícia que me chegou que o relator esteve três horas a ler o seu relatório e que o Conselho te deu meia hora para ter defenderes do que foi dito nessas três horas.
Será que isto é verdade?
Afigura-se-me muito grave que o presidente do Conselho não tenha tido o bom senso de interpretar a lei com a adequada elasticidade: os 30 minutos não podem ter o mesmo tamanho num processo disciplinar de lana caprina ou num processo disciplinar contra um Bastonário.
Mas acho que a dimensão do desastre é muito maior se for verdade que o relator esteve a perorar durante três horas, dando-te apenas 30 minutos para a defesa.
Estamos a assistir à falência do sistema de justiça, meu amigo…
Isto já não tens remendos.
Temos que construir outro sistema.
Com a frontalidade do costume tenho que te dizer que não gostei do que afirmaste, relativamente à entrada na Ordem.
Eu não espero morrer por estes dias, mas se morrer peço a todos que não me ponham lá… Prefiro outra obediência, onde sinto que a preocupação da Justiça está mais enraizada.
Mas parece-me que o caminho não é o que tu traçaste… O que temos que fazer é construir alternativas e evitar que estas coisas voltem a acontecer, escolhendo outras pessoas e, sobretudo, reafirmando velhos princípios que nos são muito caros, como a liberdade e o da tolerância. O caminho não pode ser deixar de entrar naquela casa e entregá-la a quem a está a profanar.
A ser verdade o que me chega pelos jornais, o que aconteceu na sexta-feira foi uma profanação dos nossos princípios.
Eu quero continuar a ser advogado mas não quero gente desta à frente da minha Ordem.
Quem é que pode confiar em advogados que não aceitam sequer que um colega, Bastonário, se defenda com dignidade?
Isto que está a acontecer é gravíssimo, meu caro José Miguel.
Vou tentar perceber porque é que está a acontecer...

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